South Park: o desenho que vai contra o Politicamente correto
Quem gosta de humor negro com certeza conhece o desenho South Park, impróprio para menores de 18 anos, não por conter cenas de sexo explícito, mas sim por tocar em assuntos que a atual sociedade considera frágil, como por exemplo os escândalos de pedofilia que envolvem as igrejas, aborto, atentados terroristas, feminismo, entre outros. Essa animação vai contra o politicamente correto e mostra como a liberdade de expressão nós EUA é tão sagrada quanto a vida.
Na Primeira Emenda da Constituição Norte Americana está descrito que:
O congresso não deverá fazer qualquer lei a respeito de um estabelecimento de religião, ou proibir o seu livre exercício; ou restringindo a liberdade de expressão, ou da imprensa; ou o direito das pessoas de se reunirem pacificamente, e de fazerem pedidos ao governo para que sejam feitas reparações de queixas.
Ou seja, você pode falar e defender o que quiser desde que não parte para as vias de fato contra quem é contrario as suas ideias. Um exemplo são os grupos neonazistas americanos, eles tem a liberdade de defender essa horrenda ideologia, só que a partir do momento que eles atacarem outras pessoas aí sim são imputados os crimes.
South Park faz o uso dessa emenda constitucional da melhor forma possível. Seus criadores fazem com que seu público-alvo defendam a liberdade de expressão simplesmente assistindo aos episódios que continuam sendo lançados, de todos os episódios o mais polêmico foi quando resolveram satirizar Maomé e logo depois o episódio foi censurado por conta das ameaças, porém outros também trouxeram controvérsias.
Entre eles estão a vulgaridade e representação do racismo, paródia da Cientologia, mormonismo, representação da virgem Maria e de Steven Irwin, sobre a Bandeira do México, ao ataque terrorista em Paris em 2015, sobre os transexuais nos esportes, esses são alguns dos episódios que levaram a opinião pública contra os criadores e a emissora Comedy Central que nada fez, pois isso iria contra a Liberdade de Expressão que nós tanto almejamos.
Talvez seja um dos maiores símbolos da sobrevivência do politicamente incorreto. Com um público fiel, uma linguagem acessível — embora bastante ácida — e um traço rústico inconfundível, o desenho norte-americano coleciona polêmicas desde a primeira temporada. Na mais recente dessas situações, a China resolveu banir a série, promovendo mais um acalorado debate na delicada seara dos limites do humor.
Apesar de muitas vezes estar associada a agressões que parecem, em um primeiro momento, totalmente gratuitas, a série promove debates interessantes sobre os mais variados e controversos temas da atualidade, recebendo em contrapartida boicotes e críticas dos que a veem como absurda. Assuntos como o preconceito, a cientologia, o judaísmo, o neonazismo, o feminismo, o aborto e muitos outros são recorrentes em seus episódios.
Talvez justamente por não se preocupar com o impacto causado por sua acidez, o desenho alcança um nível de deboche pouco comum no trato com situações delicadas. A sátira caricatural muitas vezes se contrapõe às grandes hipocrisias sociais e leva o espectador a refletir sobre pontos inquietantes de uma realidade que, embora seja retratada na pequena cidade que dá nome ao seriado, está inserida no dia a dia de cada nicho comunitário no mundo todo. É difícil ser indiferente ao enredo, principalmente devido à forma inconsequente pela qual é dinamizada a crítica, cujos alvos principais são normalmente as celebridades mundiais, com suas vidas construídas sobre imagens.
O mundo já observou uma tragédia decorrente de uma sátira: o atentado ao prédio do “Charlie Hebdo”, na França, que terminou com vários mortos. É o eterno embate entre a liberdade de expressão dos humoristas e uma questão de cunho filosófico: em nome do humor, toda piada, por mais ofensiva que seja, seria válida? Longe de esgotar o debate, é certo que os criadores de “South Park” desdenham de qualquer limite, combatendo as perseguições com respostas irônicas e muitas vezes criativas (no caso da China, utilizaram o Twitter para pedir desculpas, dizendo-se mais fãs do dinheiro que da liberdade e saudando o Partido Comunista chinês). Uma iconoclastia brilhante e questionadora.
Produto de um tempo em que os debates estão cada vez mais inflamados e menos racionais, “South Park” sobrevive e permanece cumprindo o seu papel de espicaçar a sociedade. O seu humor “escrachado”, muitas vezes mais profundo do que parece, contribui bastante para incutir nas pessoas uma conscientização indireta dos mais obscuros preconceitos que vivem em cada um de nós.
Nesse sentido, ainda que deva haver repreensões nos excessos, controlar a arte por meio da censura não parece ser o meio mais adequado para se combater injustiças. Até porque, aos insatisfeitos, restam as eternas opções de não assistir, boicotar ou rebater com críticas. Afinal, a própria abertura de todo episódio traz o alerta: “South Park” é um desenho de mau gosto, que não deve ser assistido por ninguém. Censurar também já é demais.